O novo, o velho e o antigo
O tempo sempre ocupou
lugar de destaque entre as preocupações do ser humano, que ao longo de toda a
sua história desenvolveu formas de medi-lo, representando tentativas de
organizar a vida. A concepção de
tempo é vista de diferentes modos pela
filosofia, física e outras áreas de conhecimento, entre as quais é considerado como
absoluto, finito, infinito, cíclico e linear.
O tempo de vida individual é linear, ocorre apenas em uma
direção, é irreversível. Por essa razão tentamos constantemente controlar nossa trajetória a partir do ponto em que nos encontramos na
linha de domínio do tempo.
Quando procurada por jovens
irresolutos diante de decisões a serem tomadas, oriento que por serem
jovens, devem se arriscar, pois se nada der certo, terão tempo de vida para
recomeçar. Somente ao refletir sobre a questão do tempo individual é que percebi o meu engano ao pensar dessa forma. Há um equívoco nessa maneira de pensar. Sempre é tempo de viver
coisas novas, qualquer coisa. Quanto menos tempo individual nos restar,
mais deveremos nos abrir para o novo.
O novo é o que nos possibilita o vir-a-ser: um novo projeto, um
novo trabalho, um novo amor, o incerto... um novo homem. É o desafio, a oportunidade de fazer e ser melhor. É experimentar, lançar-se em direção ao
desconhecido, atrever-se e correr riscos.
Muitas vezes, o novo é visto como ilógico e irracional. Mas é
por meio do que é tido como insensato
que promovemos grandes realizações. Alguns afirmam, por exemplo, que lógico é que não possamos sentir falta
daquilo que nunca tivemos, porém somos seres capazes de sentir falta do que ainda é desconhecido,
daquilo que nunca foi nosso. A partir disso, promovemos invenções e descobertas
do que precisamos, projetamos ou sonhamos,
suprindo a nossa necessidade por meio do novo.
Considerando que o tempo individual é irreversível para nós, o novo não encontra-se no passado e nem no futuro, um tempo que há de vir. O novo é inseparável do agora, não reside
em um tempo inacessível ao homem.
O antigo, no entanto, nos remete ao que foi vivido. Permite
que retornemos no tempo por meio de nossa mente e possamos reviver o que quisermos:
momentos bons ou ruins. Preferimos muito
mais reviver o que foi bom. As lembranças fazem com que possamos ter a sensação de viver o já vivido, em um novo
tempo.
O homem antigo é o que se
renova. É aquele que vive tendo a segurança do saber adquirido, das lições aprendidas, de mudanças realizadas. O ser
humano não nasce pronto, vai se fazendo
com o passar do tempo em que vive, tornando-se assim, antigo e dessa forma, nem sempre fica velho, pois somente envelhecemos quando vivemos sem aprender nada. Mas o homem antigo não é o novo homem, não se aventura, é
ponderado demais, sensato demais, prudente demais. Renovar-se é ficar como novo, não é o novo.
A apreensão e compreensão dos conhecimentos admite a reelaboração
dos sentidos dos saberes velhos que,
redimensionados por novas focalizações, resultam em nova versão do mundo já conhecido. Assim,
construído a partir do conhecimento velho, o novo impulsiona a evolução humana
e em favor desta torna-se velho, para que o conhecimento novo se faça do mesmo
modo, resultando em um movimento progressista.
Ao olharmos para a
vida, percebemos que não é possível contrapor abstratamente o velho, o novo e o
antigo. Podemos distinguir suas características artificialmente, mas essas são
inseparáveis, pois convivemos com a tríade o tempo todo. O que nos situa em um
dos três domínios, não é o quanto vivemos sob a contagem do tempo, mas como
escolhemos permanecer em relação a nós mesmos e ao novo.
Não
nascemos destinados a ficarmos velhos ou com o desígnio de sermos antigos, mas de aproveitarmos toda a essência de vida que
tivermos em nós para vivermos o novo, para sermos o novo homem. Esse é o propósito de vivermos em um plano no qual nada foi feito com a finalidade de durar para sempre.
Eunice Alonso
DALÍ,
Salvador. A persistência da Memória. Disponível
em <http://www.moma.org/collection/object.php?object
id =79018> Acesso em: 28 de jul.2014.

